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sábado, 6 de fevereiro de 2010

Sacrossanto


Missário
Missário em latim, na capela, datado de 1887.

 O mosteiro de São Bento, fundado em 14 de julho de 1598, abre as portas para uma exposição de arte contemporânea. As obras de três artistas nas salas históricas, no centro de São Paulo, são belas. Entretanto, o que chama atenção não são as obras em si - e aqui não quero desmerecer o trabalho de Carlos Eduardo Uchôa, José Spaniol e Marco Giannotti em "Arte e Espiritualidade". Acontece que a tensão maior do ambiente religioso é tão fascinante que os quadros, fotografias e instalações ficam em segundo plano quando se transita nos corredores limpíssimos, com o pé direito alto e portas grandes de madeira.

A vida dos monges 



Sacrossanto
Vitral na capela. Não sei o que representa.

Viver recluso desperta minha curiosidade. Mais que as figuras que andam com túnicas cor marrom, daquele jeito característico do monastério. O que me fascina é o mistério deste isolamento, da clausura, cujos portões de ferro impressionam pela imponência e, ao mesmo tempo, traz duas vezes a palavra PAX. É a vontade de se abster do mundo em prol de uma vida santa. Não sei muito da vida dos monges - apenas sei que eles abdicam da vida do mundo para viver em comunidade. Ora et labora; et legere. Rezam, trabalham (para não precisar sair do mosteiro) e leem muito, principalmente as sagradas escrituras.

No caso dos beneditinos, rezam sete vezes ao dia. Mas e os detalhes? E o claustro - como é, por que eles ficam lá, quanto tempo? Como é a rotina? Como isso beneficia a sociedade? São tantas perguntas que os monitores não sabiam responder.

Arte, Espiritualidade e Memória



capela

As salas têm o cheiro do meu colégio do ensino fundamental, o Colégio São José, que hoje não existe mais, e renderá uma postagem aqui - me cobrem, please. Voltando: saber que ali vivem pessoas é um fascínio, e as obras em meio à arquitetura única e aos signos católicos aos quais eu sempre fui acostumada plantam uma tensão que fui capaz de sentir fisicamente, em minha pele. Engraçado que cresci assim - em meio à religião e à arte, dois pilares fundamentais em minha educação. E nunca senti nenhum tipo de tensão.

Aos visitantes, é claro que o privilégio é andar em alas antes não abertas ao público. A capela, onde fica a obra que a mim foi a mais impressionante, estava fechada ao público há cerca de cem anos. Minha interpretação é que unir arte e questionamento em um ambiente sacrossanto é uma experiência inesquecível, que está às mãos de qualquer paulistano. A exposição é gratuita e vai até o dia 21 de fevereiro. O mosteiro fica no Largo São Bento, ao lado do Metrô (linha azul). Hoje, lá funcionam uma escola de ensino fundamental e médio e uma universidade, que oferece os cursos de filosofia e teologia.


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O contraste entre a paz e o silêncio lá dentro com a muvuca e a gritaria no viaduto Santa Ifigênia
é impressionante e inacreditável. Em frente ao Mosteiro, entrevistei o Rodela, comediante
que trabalhava com o Ratinho no SBT e hoje vende DVDs de suas apresentações.
Foi um sábado de muitas histórias pra contar...

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Hoje




"Assumir que a tristeza não é parte obrigatória do ato de trabalhar"

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Não quero falar da p. da chuva que parou a zona sul.
Chove tanto em SP que deveria ser "Alagouas".

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

A cidade não para



Já era meia noite. Não fazia frio, mas os pelos de seus braços se arrepiavam só de lembrar seu nome. O gosto amargo da lembrança de tudo que viveu e um dia foi esquecido. Ela só conseguia lembrar. Sabia que era impossível esquecer.

Em meio a tanto desgosto viu turistas fotografando ao lado de marcos que, para ela, eram irrelevantes. Ergueu os olhos e apenas desejou que o ônibus passasse... Que o tempo parasse, que talvez voltasse, e apagasse o que ela havia visto. Ou talvez que os carros que corriam nas quatro faixas fizessem jus ao nome da rua e levassem embora tudo que ela não conseguiu deixar para trás. Consolação.

Os ônibus estavam atipicamente cheios. Todos (ou quase todos) vestiam preto por diversão, enquanto para ela, era luto. O seu mundo estava de luto. E ela nem conseguia mais chorar.

Entrou no ônibus que fedia o suor dos que pulavam no show de rock. Conseguiu um banco e sentou, recostou a cabeça e ouviu os comentários sobre a banda. Empolgante. Incrível. Animal. Alguns minutos à frente, o cheiro aumentou. Dessa vez os sambistas que ensaiavam no Anhembi fizeram do ônibus um balaio de gatos - rock e samba, que ritmo dá? Colocou os fones e tentou cantarolar.

As batidas que ouvia eram do seu coração. Na madrugada de um domingo movimentado, em uma São Paulo agitada, ela desceu, abriu a porta, jogou todo o peso no chão. Deitou e dormiu o que seria um sono leve.


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Voltei! Mais poética e lírica que nunca...
São Paulo me inspira.